segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Liturgia do Vazio

Olhar as coisas em suas indefinições, dentro das névoas e cortinas, enigmas, labirintos. Buscar o mistério das coisas. O poeta em sua devoção pela procura não deve temer o perder-se, muito menos as trevas, nossa essência barroca, ou seja lá o que for, isso que nos tensiona sobre a fronteira entre a luz e a treva. Luz que revela, limpa, solar e exata, das oficina nas manhãs, dentro das alvas, luz que desperta e também cega. Trevas que sugerem, férteis, oníricas e inexatas, tentações de imaginação. O jogo eterno que coloca poeta e poesia no centro. Daí a angústia de criar tendo sobre a cabeças as espadas de dois mundos, o temor de algo mais profundo e terrível. Saltar no vazio, praticar o suicídio diário é o que faz o poeta. Ao acreditar na poesia. Mesmo sem saber sua definição. Se poeta é o que faz poesia o que é fazer poesia? será que quem lê não mergulha no suicídio cotidiano da busca também? não existe fim no poético, ele sempre excede, expande e condensa. Num jogo de opostos que o pereniza e sustenta. Quem lê precisa ser mais poeta que quem escreve (quem disse foi Leminsk) e eu acredito. Acredito na poesia das coisas. Na poesia como o mistério de todas as coisas assim como todas as coisas tem seu mistério (quem me ensinou isso foi Lorca). A poesia penetra-nos a profundeza e revela o quanto de mistério medra em nosso corpo e alma. Não existe religião no poético, mais há a liturgia do vazio, o culto solitário da forma, o cântico dos olhos em fuga, esquadrinhando o mundo, perscrutando as distâncias dentro das horas e querendo sorver o mundo, e querendo deixar-se devorar. A dor do vazio atrai, num paradoxo incontornável. E prosseguimos até a borda do nada. Nos resta perder o medo... e saltar.

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