I
Um anjo torto, um vampiro. Um xamã, um caralho. Pela voz do fogo e pelo
apagamento das sobriedades. Pela língua solta e fria no encéfalo eletrochocado
de poemas. Não permitir o confortável, nem a palavra ao alcance do braço –
escalar o perigo e berrar. Experimentar os abalos sísmicos das avenidas e não
calar. Sujar-se de incêndios.
II
A vida só deve arder no olho de cirrose desta
cidade. Qualquer metrópole suplica pelos suicídios de seus poetas: seja com
gás, com navalhas ou com sintagmas. Leitura de ébrio para escândalo dos bons
moços e das castas senhorinhas de sacada. Está escancarada a caça ao que ainda
não tem feições nem nome. Eis nossa primeira persona non grata.
III
O que se passa meus chapas? Olhem à volta. Lá
fora o boato se espalha: o poema não é só brinquedo ou trapaça, sem-vergonhices
com a linguagem na vulva da língua. O poema também fode teu neurônio, tua
risada. O poema, as mãos de seda e o coração de ferro. Tua arrogância na mesma
poça de mijo, sêmen e bile de um indigente. Sem perdão.
IV
Não temer tesoura e cola. Mas ter cunhões pra
olhar nos olhos dessa galeria de putos que nos precederam. Saber que eles
permanecem aqui perto, nossos vizinhos de quarto, gemendo mais alto, fazendo as
orgias mais originais, tendo os mais longos e invejáveis orgasmos. Chegaremos
lá?
V
O rock ainda faz os melhores hematomas. Ainda
é rock a roda punk. Mas ninguém admite estar cansado dessa roda onde só se bate
com luvinhas de pelica. Vamos lá, onde o primeiro foco de incêndio, a primeira
baderna no olho do cu da rua? Há muito tempo eles acusam-se de estar fartos e
nós? Será que ainda demora pra perceber que o recreio já acabou? Pula pra cima, cai do muro que embaixo só
resta os cacos. Eu quero. Vi. Ver.
VI
Pela mulher atravessando todos os olhares de
fome. Ela sendo o poema que devasta nossos exibicionismos de garanhões capados.
Pela mulher percebendo as mentiras do poema e de quem o sustem e não se
deixando enredar: fazendo o seu. Sereias seriais, jamais jamais só tigresas com
muito ódio no coração: o poema é a última vibração dessa chama. Pela mulher, o
monumento de seu reinado sem vingança. A maravilha de seus mamilos. Nossa fome persiste,
nos resta engolir em seco e vidraças. Pela mulher em pelo.
VII
Daqui não dá mais pra fazer meia volta.
VIII
Pela devastação de toda zona. Zona de
conforto. Pra quê tanto mimo? Meninos e meninas das rotas de fuga, mamãe e
papai sempre a postos, ícones de merda dessa geração. Eu quero olhar nas
vísceras derramadas do louco. Onde estás ó louco dos vigésimos andares da
insanidade metropolitana? Onde tua queda livre perante pessoas cheias de
nojinho e pirraça? Onde estás que não chegas com teu chinelo a tiracolo pra
enfiar na bunda desses pirapatéticos?
IX
Não. Não saberão o que eu soprei ao nada. O
que eu perdi. Ninguém sabe perder. Imagine perceber quando acontece com o
outro.
X
Cada um anda sozinho tão acompanhado. Desolação.
Todo mundo é cabeça aberta, todo mundo respira um mundo novo de possibilidades.
Pula que eu quero ver. Vamos! Enquanto eu mastigo a fúria, que vem pedrada como
minha lágrima e depois suspende até minha fala. Patéticos, meus camaradas
patéticos, maduros como azul com amarelo, sábios da vida e das versões
perfeitas do sexo feito com medo. Experientes maníacos da autopromoção. Pela
gagueira que um dia acometerá vocês. Pela mudez da boca costurada.
XI
Eu não conheço as planícies. Eu não me
interesso pelo que diz o monge, não me peça ouvidos. Eu não pretendo calma. Eu não represo por
ter calma, represo por ter fúria e porque eu quero. Meu querer depois de aceso
só vira sombra no estômago de um cadáver. Eu posso tocar isso. Sim, eu posso.
Pela loucura de quem não usa retrovisores, pela loucura de quem treme, mas não
suspende a mão, pela loucura de quem não tem medo do abismo e sua multidão de
águas. Pela loucura de não poupar os fígados.
XII
Essa não é. Não é. Não é a hora de se
arrepender.
XIII
Eu sonhei com uma tribo onde as coisas eram
divididas. Essa tribo hoje chupa as raízes do bosque mais frondoso. Ossadas
patéticas, gente outrora viva, utópica e bem mais patética. Alterar-se para
perceber mais fundo em cada pose a raiz patética de nossos dilemas todos. Pela
vida mais interessante que as notas em meu caderno encardido. Pelas portas das
pernas sempre abertas. Pelo fim dessa merda de máscara adaptável a qualquer
ecossistema. Ah a música não me deixando esquecer vossas desafinações. Pelo
amargo mais amargo desse copo e por minha cara que não vai se alterar. Pelos
meus olhos que não cansam de esperar a ruína de vossos cabelos.
XIV
Permaneço só. Já sei onde cada peça repousa
antes do bote. Agora eu. Eu. Eu quero tocar isso pela destruição de tudo o que
é frágil. Tão frágil que sequer consegue admiti-lo.
XVI
Estamos em depressão. Meus bens! Onde meus
bens e a tribo fodida assentarem. Batucaremos
XVII
Aplausos! Aplausos! O número está só no
começo. Bobocas da corte. Menininhos maus. Poliglotinhas de xoxota rasa. Vocês sempre se saíram muito bem de todo
buraco onde enfiarem essa cabeça de vento. Vamos à merda, vamos todos. Todos e ninguém.
Dizem que a gente chega lá.
XVIII
Salada. Nosso poema bem poderia ser uma
salada de frutas salgadas. Uns bombardeios no sempiterno das virilhas. A nudez
é o melhor recado e o mais patético. Ó patéticos testículos! Ó patéticos
grandes lábios!
XIX
Selvagem! Dicionário, cemitério, sanatório:
mijemos na cabeça, mijemos. Mijemos na cabeça desses filhos da puta que passam
pertinho. Pertinho do poema e ficam fitando enojados. A orgia. Pela decapitação
das cabeças de vento! Já!
XX
Estamos bem na foto! Meus bens! O amor faz cu
doce, não quer me dar nem um beijo de língua, a buceta dela é tão linda! É tão
linda! Tão suculenta! O amor é essa coisa que eu nunca acreditei com olhos
arregalados. Eu sou um pervertido, meu amor. Eu quero te comer sua linda, eu
não quero te dizer um poema: troco meu poema pelo meu pau.
XXI
Geração de merda essa minha. Estamos sozinhos
e fodidos. Eu gosto de rir na cara desse século: não tenho medo de sua boca de
esfinge, de seu cu e suas engrenagens. Esse caralho de século e suas putas
parindo poetas. Os homens comem as mulheres, as mulheres se comem e depois dão
pros homens e está tudo bem. Amor livre?
Ah deixemos de utopias baratas que o shopping está cheio de escadas
rolantes exatamente pra que evitemos esse tipo de esforço físico. Amor livre?
Ah conversa de otários e orifícios.
XXII
Quando pensei que o malnefasto estava pronto
me acenderam tantos motivos... temo nunca mais termina-lo: é certo que a certa
altura o abandonarei e mais certo ainda que o lerei para quem deve ouvi-lo.
Foda-se o resto. Quem se magoar que procure uma estaca para se empalar.
XXIII
Se eu disser que estou farto vocês vão
considerar um plágio então que se fodam vocês também. Pois estou farto mesmo.
Olhem à volta esse circo, esse espetáculo repetitivo e canibal... pois fiquem
todos sabendo: sou mesmo cruel quando quero. E eu quero.
XXIV
A fúria? Eu queria que escapasse do texto
direto para a jugular dos putos que aporrinham minha vontade de dizer coisas
breves. Sangrá-los seria um magnífico e verdadeiro espetáculo.
XXV
Eu paro quando quiser. Quando achar que já
ardeu o suficiente. O texto parece algo tão decente: me dá pena às vezes... bem
pouca pena... Bem poucas vezes, mas o texto deles acontece num instante tão
singelo: é uma lástima enfiar-lhe uma broca no cu – pena não fazer isso com
quem o escreve... pena mesmo...
XXVI
Sabem mesmo o que é a loucura? Brincando com
tanto fogo vocês chamuscam a bunda seus malandros... que caiam de cara na
fogueira: não se metam com o xamã que ele lhes puxa a perna, fode vocês de mau
jeito... brincar com fogo: enquanto a gente gasta os dias tentando mantê-lo
aceso... se isso for justo eu me afogo na primeira maré de setembro. Enquanto
isso, estou rindo, rindo com força porque somos muito. Muito. Muito patéticos.
Muito patéticos.
XXVII
...
XXVII
Outra coisa escute bem. Escute só. Mas escute
mesmo: Eu também não quero fazer razão. Razão! Razão?! Ah! Eu não quero.
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Salve o vampiro & o Xamã. Venham pegar essa turminha que tem medo...